dezembro 11, 2012

Vinte e um graus

Na semana passada não tive tempo para escrever mas hoje cá estou para actualizar o que tem acontecido.
Quinta-feira passada afinei um Yamaha C5. Que som, que jóia.
São mesmo pianos muito bons e a afinação também foi pelo mesmo caminho. A sala onde estava a afinar estava bastante fria por causa das paredes de pedra, mas eu estava tão concentrado na afinação que não dei muita importância a esse facto (tinha horas para sair dali e horas para chegar a outro lugar). Posto isto, deixei-me de preconceitos e utilizei um ciclo diferente, aquele das emergências para pianos que não estão a querer lá ir "a bem". Lá comecei e despachei a oitava central num instante.
Entretanto, o cliente chegou e vem-me cumprimentar visto que eu tinha começado a afinar sem saber se ele lá estava ou não. Falámos um pouco e ele referiu que a sala estava muito fria, oferecendo-se para ligar o ar condicionado (sim, eu sei...). Mas eu só tinha olhos e mente para a afinação que nem me lembrei em dizer que não. E o previsível acabou por acontecer: oscilações loucas e imprevisíveis na oitava-padrão, aquela que servirá para afinar a maior parte do piano.
Antes de começar a tirar as notas paralelas, fiz a rotineira revisão para saber se ia espelhar  frequências correctas ou se ia multiplicar um erro de afinação. Foi aqui que notei logo algo de errado. Estava a ouvir coisas (leia-se frequências) que faziam um minutos não lá estavam. E percebi logo que tinha sido o ar condicionado porque de repente dei por mim a não sentir frio. "Mas que erro!" - pensei eu. 
Levantei-me, fui reduzir o ar ao mínimo e corrigir os danos na afinação. Este contratempo, porque tive de esperar que a temperatura baixasse, deixou-me completamente irritado comigo mesmo porque fui descuidado em relação à temperatura e isso atrasou o meu trabalho em mais de uma hora. E lembro-me que fiquei logo em tensão para acabar o trabalho e recuperar o tempo perdido. O que mais me irritou foi que as diferenças nas frequências eram tão pequenas e confusas que quase que dava em doido pela quantidade de trabalho desnecessário que tinha arranjado só para mim. Tive de ouvir novamente, unir novamente, verificar novamente, acordar novamente, tudo por causa da minha distracção.

Consegui fazê-lo, e à medida em que ia avançando na afinação os bons resultados iam  finalmente aparecendo, com os acordes a ficarem com uma cor muito agradável. Ver o trabalho e esforço a compensarem bem à frente dos nosso olhos é um dos melhores incentivos que um trabalhador pode ter. Acabei de afinar passadas três horas mas fiquei mesmo contente com o resultado final. O som era bastante quente e dava vontade de o abraçar; é uma ideia estranha, querer abraçar algo que ouvimos. Mas o que traduz aquela manhã é mesmo isso. 

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